da resistência
do sopro
daniel glaydson

and the hard
words
I ever feared to
say
can now be
said:
I love
you.
( "Confession", Charles Bukowski )
O sopro de onde falo
resiste
( "Notas sobre poesia", Solange Rebuzzi )
e agora
se só consigo escrever sobre mentiras
e tu ; lá vens com tal tamanho fato
com tal tamanho fado
fardo
( preciso ser ultrapassado
por todos aqueles que desconhecem teu final
este teu final com anseios de pássaro
que me golpeia de plásticos a se contorcer em lumaréus de fogueira
desnuando minha pele em panos de voltumundos )
disseram
: talvez
: que poderíamos ser fundamentais
sem saber que já eras
: que parecia fraqueza
sem saber sem saber
de nossa incerta epilepsia espiritual, plusironicidade
as folhas de teu cipreste eram de matéria viva
os relógios de nossas cidades esqueceram de parar num afã enlouquecedor
de exatidões
¿ não te ofereci meu guarda-morte
ou foste tu quem o desprezaras ?
corto-me diariamente
– esta noite, o sangue absteve-se
como que a coagular papéis não-lidos
e eu ; sentindo-me tanto,
o próprio nó dos teus panos
fui abandonado pelo corpo que escolhi profetizar
e desenhei a forca errada, frágil, solúvel
prevendo mortes mais distantes
e tu ; lendo fatalidades
reescrevendo-as, remodelando-as na dança de teus pés
espetáculo para dois pagantes : jamais e neverness
( estiveras perdoado desde o começo :
vendias a alma para revisitá-la )
as mesmas palavras de tua mãe
envelheceram de forma assustadora ;
eram as últimas últimas de um
ultimato
talvez nem adiante mais morrer
– pois que adiantava
tudo isso parece evitável
– e é tão angustioso que assim seja
a seca d’agora
não é falsa como a de outrora
estiagem de lágrimas rachando o chão
: é céu sem noite e nuvens demais
nuvens, estes sonhos dos sonhos acordados
latente, tento ir
e penso que tu somente sabias aonde
dormirei como se meu guarda-morte ; não o visse por aqui...
¿ onde estava o irmão mais velho de deus para colher-te o último suspiro
aos lábios ?
: a fernandes nogueira :
oiço
uma ventania.
dentro ou num lugar não sei onde,
leva consigo algo – que não sei quê.
ou deixa, aceita, permanece, transcende
sinto esse vento de deserto,
não o calor a transbordar-me pelos poros
nem a sede a fazer-me suplicar miragens
a solidão
a fadiga
ou a perda
não há em meus cabelos terra
nem me seguem pegadas
ou vejo estes areais a correr fino por meu corpo
mas oiço.
e o que sinto, se sinto
é que deus, se existisse, se existe
perene, passa, sequioso, e sopra.
e não há nada, entre nós,
a ser dito.
só 1
olho de cada vez
é o que cabe ver sempre
ao me lançar no canyon do olhar dela
capitoso
é assim :
concentro nos olhos dela
e parece-me impossível que haja dois.
penetro, 1 de cada vez,
só
dois olhos juntos dizem mais do que se pode ouvir
assim talvez seja melhor...
continuar a vê-la de pula-cordas amarelo
nuvens em perfeitos tons de azul escuro
no background
bochechas abuletadas de vermelho cocote
um sorriso pedindo dedos
todas as carnes apontando os cabelos descabidos
esvoaçados
toda ela um projétil para o alto
atiçando-me
quelque chose de retrato pintado
nela
melhor assim.
o que dois olhos têm a dizer
ninguém deve escutar.
dois olhos respiram demais
a verdade está mesmo talvez em não saber
en el ojo profundo duermen palmeras exorbitantes
já dizia nicolás guillén
1 de cada vez
e basta.
vem
no equilíbrio de sua cadência eterna
arrancar-me dos pés o chão
sim, sugando-me
arrancar o chão
como um tornado ao fundo do mar
levando a areia
o espaço e o tempo
perca-me
em distância e profundidade
em fundo e forma
em mulher e homem
espaço e tempo
sim, machucando-me
em veneno de néctar e sal
et en diverses langues
equilibrado na cadência eterna
da tua sinfonia de vômito branco
mar
equilibrada na cadência extrema
da tua margem sem cor
mulher
dilacerem-me –
lubrifica os corpos
e interrompa os beijos
marítima
exército mulher
pela cadência eterna
daquela sinfonia de vômito branco
anterior a deus, amo-te
por sete gerações
pretérito e além
anterior
a deus
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